.
.
I got a letter this mornin'.
How do you reckon it read?
Said you better come on home, Son.
That girl you love is dead.
I got a letter this mornin,
I say how do you reckon it read?
You know, it said, "Hurry, hurry,
How come the gal you love is dead?"
Existem algumas obras que são obrigatórias. Estas o são por serem referências em seus respectivos campos (falo de obras artísticas). A música é cheia destas referências, que se tornam ícones pelos mais diversos motivos. As mais significativas, no entanto, se tornam ícones por representarem um momento particularmente iluminado dos artistas que as criaram, de modo que a própria obra seja capaz de definir tudo o que aquele determinado artista produziu. "Death Letter Blues" é uma destas obras. Você não pode ouvir Son House sem ouví-la. E muito menos ouví-la sem que, ao final, tenha entendido o que o Son House é (o homem foi, o bluesman é), e como sua música é.
Eddie James "Son" House Jr nasceu em 21 de Março de 1902 em Riverton, Mississipi. Ou não. Essa informação é um tanto controversa. Os documentos oficiais atestam esta data como verdadeira, mas o próprio Son House já forneceu datas imprecisas e contraditórias sobre seu nascimento: ele seria um homem de meia-idade na época da 1ª Guerra Mundial; ele teria 79 anos em 1965; ele teria nascido em 1886. Fato é que gravações feitas em 1941 e 42 apresentam uma voz que certamente não é a de um homem jovem.
Son House foi um dos mais importantes bluesmen de todos os tempos, e é um dos ícones maiores do blues do delta do Rio Mississipi, ao lado de nomes como Robert Johnson, Charlie Patton, Willie Brown e Leroy Williams. Ele não era um virtuose, mas compensava sua falta de técnica com um estilo extremamente marcante, com riffs vigorosos e ritmados, freqüentemente com "bottleneck" (slide guitar), e uma voz profunda e inconfundível. Ele gravou para a Paramount Records nos anos 30 e para Alan Lomax no início dos anos 40. Depois disso, sumiu para o público...
... sendo redescoberto nos anos 60, quando havia um "revival" do blues no meio musical, especialmente devido à explosão de bandas de rock fortemente inspiradas nos bluesmen americanos, das quais os Rolling Stones foram a mais forte expressão. Foi nesta "redescoberta" que House gravou "Death Letter" pela primeira vez, em 1965, embora a canção date de pelo menos algumas décadas antes disso.
Son House era um verdadeiro ícone do blues. Sua própria vida é uma espécie de síntese do blues, inclusive com alguns mistérios que não poderiam faltar. Ele ajudou a disseminar entre os jovens apreciadores de blues nos anos 60 a lenda (?) de que Robert Johnson teria vendido sua alma ao diabo numa encruzilhada a fim de conseguir sucesso tocando.
Infelizmente, ele parou de tocar nos anos 70, e morreu em 19 de Outubro de 1988 (daqui a dois dias se completam 17 anos). Não sem antes dizer, em uma entrevista devidamente gravada e mostrada na excepcional série "The Blues", produzida pelo Martin Scorsese (que certamente terá seu post, num futuro próximo), o que "quotei" abaixo do título deste blog. Sim, é dele: "... 'blues this', 'blues that'... This is not the blues! I'll tell you what the real blues is about: B-L-U-E-S!"
"Death Letter Blues" é uma canção vigorosa, em que ele mostra todas as características de sua música. Há um riff principal marcante, com uma batida forte (sim, sem palheta). A estrutura das estrofes é a típica do blues, com uma frase, uma repetição, seguida de uma espécie de "conclusão" (com variações, logicamente, até porque, diferente da maioria dos blues, "Death Letter" possui uma letra muito grande). A letra varia um pouco de gravação para gravação (há algumas), mas a idéia principal é a mesma, e trata de um homem que recebe a notícia de que sua mulher morreu e tudo o que ele sente e pensa no decorrer deste acontecimento (aliás, não poderia haver tema mais "blues").
Sendo uma música tão marcante, não é de se estranhar que tenha sido "coverizada". Desta vez, quem o fez foram os White Stripes, em seu álbum "De Stijl", lançado em 2000. Eles também tocaram sua versão no Grammy Awards de 2004. Os mais puristas certamente torcem o nariz para esta versão, bem como não devem suportar ouvir falar em White Stripes. Eu não morro de amores pela banda, mas ouvi o cover deles, e achei que o resultado foi bom. Ela me lembrou um pouco o que o Led Zeppelin fazia com os blues antigos (guardadas as devidas proporções, pelo amor de Deus!!!), embora seja verdade que o Zeppelin transformava muito mais os blues do que o White Stripes fez com "Death Letter". Claro que o Jack White não tem a voz do Son House, mas a letra não foi alterada, e ele canta o melhor que poderia (consegue não estragar). É evidente, também, que a banda daria uma roupagem mais "roqueira" à música, e o faz, com alguma competência, a meu ver. Acho que o cover é válido, até mesmo para levar o nome do Son House e do blues adiante para as gerações mais recentes. Sugiro que confiram.
LINKS INTERESSANTES:
A sempre útil Wikipedia
*Este post foi construído à audição exaustiva de três versões diferentes de "Death Letter", uma delas a do blog do cara, e outra a versão de estúdio do White Stripes.